sexta-feira, 4 de março de 2016

Um pouco sobre como tudo começou

Por Vivianne Nunes

Enquanto aguardam a saída, assistem vídeos infantis e se divertem
com a famosa Galinha Pintadinha
Quem acompanha o atendimento dado às crianças no Cotolengo nos dias de hoje talvez nem possa imaginar que há vinte anos atrás o cenário era bem diferente. O carinho e os cuidados, certamente eram os mesmos, mas a infra-estrutura não. Os meninos e meninas com paralisia cerebral eram atendidos debaixo da sombra das mangueiras que haviam no terreno que tem aproximadamente 300 metros quadrados. E quem nos conta essa história, fala com conhecimento de causa. Valentim Calegaro, 66 anos, é voluntário da obra desde antes de sua fundação e ajudou, com o trabalho que ele chama de “trabalho de formiguinha”, a chegar onde estamos, comemorando 20 anos de história. “Pra começar que o terreno estava invadido e foi uma longa briga na Justiça pra gente conseguir tomar a posse dele”, conta dando início ao relato.

Calegaro é serralheiro, pai de quatro filhos e avô de dois netos. Em nossa conversa, ele cita tantos outros nomes importantes da história do Cotolengo em Campo Grande, como o do padre italiano André Giuseppe Sclaglia, que também participou do processo e do casal Hernani e Gisela (In Memorian). “Ela foi uma grande mulher, doou 24 horas do seu dia pra cuidar dessas crianças”, lembra Valentim. Pra ele, cada voluntário que participa ou participou da obra são importantes e fazem parte dessa história, pois foi graças a eles que as instalações puderam ser construídas.

Depois de todos esses anos, os olhos azuis do Seo Valentim ainda enchem de lágrimas ao lembrar das dificuldades que passaram. “Uma vez fui levar uma cesta básica para uma família no Natal. Quando cheguei, ouvi aquele chorinho e fui entrando. A casa estava vazia e lá no quarto eu vi aquela criança em uma espécie de cercadinho de pau à pique. Ele estava sozinho e estava sendo picado por formigas. Peguei ele nos braços e levei dalí.”, lembra emocionado.  O voluntário conta ainda, que antigamente os pais precisavam trabalhar e não tinham com quem deixar as crianças, mas também não tinham a consciência de que eles não poderiam ficar sozinhos. Hoje em dia, com o atendimento do Cotolengo, isso mudou muito. Ainda há muitas crianças na fila de espera, mas as famílias também são mais conscientes sobre esse atendimento especial que precisam. Claro, ainda falta muito para que seja o ideal, mas o fato é de que muita coisa mudou em vinte anos.

Valentim Calegaro e seus 20 anos de Cotolengo
Pedra Fundamental

Quando houve a inauguração do atendimento 20 anos atrás, houve também uma cerimônia com missa e a apresentação da pedra fundamental. Lá, foram guardadas moedas de vários países representados por padres que vieram ao evento. Haviam moedas da Itália, Argentina, Espanha e de outros países. Eram 25 no total. Mas segundo o relato do voluntário, no dia seguinte quando chegaram, a pedra fundamental tinha sido removida e saqueada. Até hoje não se sabe se isso aconteceu há mando de alguém por conta da situação do terreno que antes era invadido, ou se foi apenas um roubo comum. O fato é que parte das moedas foi encontrada com alguns menores que moravam na região e devolvidas ao local onde também foram colocadas cartas e imagens. “Haviam imagens em bronze e outras muito bonitas de outros Países mas essas a gente não conseguiu de volta”, lembra Valentim.


Voluntariado

E quando a gente caminha pela instituição durante o dia, pode observar o atendimento prestado com muito amor. Não se vê cara feia, nem reclamação. Ao contrário, pessoas trabalham ali, dedicando não apenas o seu tempo, mas de fato, um pedaço do seu coração. Para seo Valentim, que é a pessoa que me acompanha nessa passagem pela instituição, o primordial para atuar na obra é ter amor e alegria. “A gente tem que vir pra cá com o coração feliz e pronto pra ajudar, não pensando que é uma obrigação!”, afirma. Ele nao tem contato direto com as crianças. É um dos voluntários que trabalha na infra-estrutura dos eventos. “Não levo jeito pra lidar diretamente com eles, mas o tempo que tenho pra me dedicar aos eventos, sempre estou por perto e faço questão de encaminhar uma carta de agradecimento aos que de alguma forma nos ajudam com doações”, conclui.

Professora Diva trabalha há sete anos no Cotolengo
Atualmente, o Cotolengo conta com a ajuda de apenas sete voluntários efetivos. Segundo a coordenadora local, enfermeira Ana Lúcia Jacques Flores Corrêa, são muitos que participam e doam um pedaço do seu tempo nas festas e eventos para a arrecadação de verba ao Cotolengo, mas no dia-a-dia, são apenas sete ajudando os cerca de 20 funcionários que atuam de segunda a sexta-feira. “A gente ainda precisa de muita ajuda, não apenas para passar o dia com as crianças, mas para lidar na limpeza, na lavanderia onde são esterilizadas as roupas de cama, na cozinha, no jardim. Toda ajuda é sempre vem-vinda”, afirma.

Em meio à todas elas, muitas histórias de luta se misturam. Algumas das crianças são cuidadas pelo pai e pela mãe, outras apenas pela mãe e ainda há aquelas que foram abandonadas de alguma forma e são cuidadas por tios, tias, avós. O fato é que são crianças totalmente dependentes do cuidado de terceiros e nem por isso são tristes. “Não gosto de pensar que são tristes, acho até que são bem felizes, mas cada uma dentro de sua limitação”, afirma Ana.



No decorrer deste ano, outras histórias serão contatas neste espaço. A experiência de conversar com essas pessoas é enriquecedora e a cada conversa, a gente vê uma lágrima rolando. Seja deles ou minhas. Mas não digo que sejam lágrimas de tristeza. São lágrimas de emoção por saber que o amor de Deus está presente e que é muito bom saber que a bondade divina ainda habita no coração das pessoas.

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